Depressão

O Transtorno de Humor Depressivo vem sendo divulgado como a doença mais incapacitante do século XXI, por instituições de saúde pública e por profissionais que merecem todo o nosso respeito.
Porém, pelos anos de estudo do trauma a que me dedico, e das doenças principiadas pelo estresse contínuo desde a gestação, e que vão se agravando durante as fases do desenvolvimento por constantes retraumatizações, minha tendência é discordar da análise desses pesquisadores.
Penso que a ansiedade é quem inicia o processo, embora o faça de maneira lenta e silenciosa, porque um caráter levemente ansioso se tornou normal e é valorizado na sociedade apressada ocidental.
A depressão decorre dela, quando todos os limites foram rompidos e não há mais como se controlar sozinhos a sobrecarga instalada sobre o sistema nervoso.
Infelizmente, o ritmo acelerado da vida e o imediatismo cada vez mais presente fazem com que pessoas procurem por soluções milagrosas, pelas "pílulas mágicas" compradas na farmácia mais próxima e que encerrem seu sofrimento. E isso é fruto da ansiedade.
O aumento nos casos de suicídios como ato extremo para pôr fim ao sofrimento insuportável se mostra como outro sintoma social. Campanhas como o setembro amarelo buscam conscientizar a população para os indícios de que esse risco possa existir e se concretizar, caso não seja observado e atendido a tempo.
Defendo a hipótese de a ansiedade vir em primeiro lugar, porque a ativação constante do Sistema Nervoso Autônomo (SNA) pelo seu ramo simpático pode chegar a níveis extremos, e por vezes inviabiliza a estabilização e reequilíbrio pelo ramo parassimpático. Isso ocasiona o processo ansiogênico e também o traumático, como parte da fisiologia, não levada em conta por grande parte dos clínicos procurados por quem sofre e busca alívio. O estresse pós-traumático é configurado por uma sintomatologia ampla e complexa, levando a inúmeros diagnósticos equivocados.
Como as reações mais comuns são o retraimento social e afetivo, a insônia e uma angústia aguda, muitos profissionais da saúde, incluindo psicólogos, tratam o caso como se fosse depressão (onde também aparece um quadro ansioso), o que tende a mascarar e confundir os sintomas, que mal avaliados, podem acarretar dependência farmacológica com amplos efeitos colaterais indesejáveis.
A culpa não é exclusiva de médicos, que abordam o indivíduo em função de suas especialidades e que, em certos casos deveriam encaminhar esses quadros para outros especialistas. Os programas da graduação nas universidades de medicina deveriam ser revisados e atualizados.
Estresse pós-traumático não é depressão, e sim uma de suas causas, e precisa de tratamento bem específico. Algumas vezes com apoio de antidepressivos e ansiolíticos para estabilizar o quadro, mas não apenas com eles.
O estudo ACE Family (Experiências Adversas na Infância) produzido em meados dos anos 90 nos EUA, mostrou que a exposição precoce ao trauma produz alterações permanentes no desenvolvimento do cérebro, afeta o sistema imunológico e até a forma como o DNA é replicado. Ou seja, a maioria das doenças realmente incapacitantes, além daquelas que provocam o maior número de mortes atualmente, são provocados por negligência, abandono e maus-tratos na infância, que acabam por modelar o organismo para sofrer pelo resto da vida.
As causas desses males são tratáveis clinicamente, por terapias contemporâneas baseadas na fisiologia do sistema nervoso, sem a necessidade de fármacos, a não ser, como colocamos acima, nos casos em que o quadro necessite estabilização.
A questão é que esses tratamentos rápidos e altamente eficazes são muito recentes (menos de 50 anos) e continuam desconhecidos nos meios acadêmicos, e portanto, não são transmitidos aos estudantes que irão se deparar com os clientes debilitados em seus consultórios.
Estudos transversais demonstram que apenas 30% dos leitos hospitalares são ocupados por causa física. Os outros 70% são de quadros iniciados por questões nervosas, e que foram se agravando até irromperem no corpo como doenças psicossomáticas. Quanto mais precoce isso for tratado, menores serão as consequências.
Crianças mostram cada vez mais que precisam de ajuda, principalmente nos comportamentos disfuncionais e agressivos. As escolas se mantêm despreparadas para lidar com a questão e, não raro rotulam esses alunos como 'problemas' e encaminham para neurologistas e psiquiatras. E dessa forma a sociedade permanece doente emocionalmente, até que alguém coloque sobre elas um olhar diferenciado, resgatando a autoestima comprometida nos cuidados parentais.
O caminho para a cura passa pelo resgate da percepção corporal perdida por tantos confortos e modernidades, e pelo resgate da resiliência e anti-fragilidade no sistema nervoso, só alcançadas pelas Psicoterapias Somáticas ou Neuroterapias mais recentes.